terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

À Revelia

Imagina a vida social daquele seu professor mais chato da faculdade. Aquele que tinha doutorado na Alemanha e que cobra de tudo e de todos um sério rigor acadêmico. Imagina ele metendo com a mulher. Perae. Que vida? Que mulher? Que metendo?

Pois é. Pedro é assim. O protagonista de "À Revelia", o "primeiro" romance "adulto" da sua, da minha da nossa querida e amada Liliane Prata. Aspas porque eu acho "Uma Bebida e um Amor sem Gelo, por Favor" bastante maduro e apesar de nunca ter lido, tenho muita vontade de ler "O Diário de Débora" 1 e 2.

Mas pensando nesses dias, nessa vida nos últimos tempos entendi o porquê de ser adulto. O que muda da faixa teen para a faixa dos crescidos parece ser a preocupação. Ou as preocupações. Pedro é uma pessoa chata. É um cara chato. Mas que não tem preocupações.

Quer dizer. Ter, tem. Mas no geral, a vida está ótima do jeito que está. Será? Casado há anos com a mesma mulher, sem um envolvimento carnal e afetivo mais forte do que o respeito e a boa companhia. Filhos criados. O orgulho de ser uma autoridade em sua área do conhecimento. E bota orgulho nisso.

Romances? Literatura? Para quê? Escrever um livro sempre foi seu sonho. Sonho este que foi abandonando na medida que foi obtendo cada vez mais títulos. Vai ver por isso rolou uma identificação com o personagem. Sabe-se lá.

Só sei que Pedro é mala. Mas é um retrato das nossas vidas. Exatamente como elas são. A história gira em torno de Pedro e de Betina, sua amante. E de seus surtos para que ele se separe de Vera, sua mulher. E de todos seus ideais, anseios e planos de felicidade.

O perfil psicológico de todos esses personagens é muito bem construído pela Liliane. Pelo menos eu achei. O passado de todos é crível. E achei também um negócio curioso. O livro meio que não tem meio e meio que não tem fim. Interpretação minha. Ele se arrasta. Mas não que isso seja uma crítica. Longe de ser uma crítica ou uma ofensa.

Na verdade isso foi uma das coisas que eu mais gostei no livro. O fato de Liliane construir literatura a partir do trivial. Da banalidade. Diálogos são suprimidos por frases como "e ela falava onde comeu e o que fez após a aula de dança". Tá ok. Não é a frase exata, mas é essa a ideia. Nossa vida é acordar trabalhar voltar pra casa dormir. acordar trabalhar voltar pra casa dormir.

Qual é o propósito de estarmos aqui?, na Terra, digo. Fazendo isso. Uns com mais outros com menos. De onde viemos? Aonde vamos parar? O que vem depois? Passamos sei lá 95% das nossas vidas fora de casa. Em escolas, em trabalhos. Porquê? Pra quê? Pra quem? Qual é o sentido disso tudo? Será se ser adulto é lutar pra não cair em frustração?

Eu não sei muito bem. E o livro não ajudou a responder essas questões. Na verdade, ao retratar esses 95%, que é de uma pessoa cumprindo suas obrigações e entrando em choque com seus desejos e a vida que quer levar e sendo confrontado por sua amante por não ter coragem de tomar as rédeas de sua vida, Liliane Prata me fez questionar profundamente alguns valores e entar em contato com alguns dos meus desejos e sonhos que estavam quase adormecidos.

Ornou com o momento de crise, mas orna para momentos tranquilos também. É um livro bom. Não é um livro engraçado, divertido ou tipo viciante que você não consegue parar de ler. Mas é bom. Talvez melhor do que o romance de Pedro, talvez melhor que o meu romance e a minha literatura.

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